15 agosto, 2014

Discurso sobre o "Amor de Pai"

No Dia dos Pais, o seminário reiniciou a programação do Grêmio Literário Santo Antônio com uma sessão solene. O orador da noite, o agremiado Lucas Weigert do Nascimento, brindou a todos com seu discurso acerca do significado do amor e a importância do pai como modelo aos filhos. Confira:


"Você não serve para nada, mas eu não sei viver sem você".
(Pe. Fabio de Melo).

Saúdo com estima, essa mesa composta pelo Diretor, Frei Rodrigo de Santos; o Presidente, Gabriel Luiz Martinelli; e o Secretário, Odilon Voss. E ainda estendo a saudação aos agremiados desta academia, aos seminaristas e aspirantes.

Quando pedi para fazer esse discurso já no começo do ano, imaginei que seria o tema mais fácil de ser abordado: eu estava errado. O mesmo me fez questionamentos que me emocionaram. Ganhei a difícil tarefa de fazer e trazer algo novo para esse Grêmio Literário. O que me deu coragem para escrever isso foi a paixão e carinho que adquiri pela academia, é inexplicável estar em cima desta tribuna para proferir meu discurso sobre os dias dos pais.

Tradicionalmente, os discursos de Dia dos Pais, pelo menos dos que me lembro, são recheados de poesia, agradecimentos, etc. Comecei minha pesquisa por aí. Descobri que o dia dos pais surgiu, institucionalmente, nos EUA, século XX. Assim como o dia das mães, é uma homenagem a um cara que é um dos pilares da família. A família é a sua equipe de vida. O maior investimento é o tempo. Seus recursos são atenção, cuidado e carinho.

Preparando-me para o referido discurso, lembrei-em de alguns pais que reclamam que seus filhos estão sempre grudados em videogames, televisão, tablets, notebooks, etc. Isso me fez questionar para quê os filhos preferem outras coisas aos seus pais. Minha conclusão foi tempo e atenção. Se os pais não têm tempo para os filhos, por mais que os amem, não conseguem demonstrar adequadamente. Isso resulta num "abismo" sentimental ou emocional que cria barreiras ao relacionamento. Não haverá confiança. Um ciclo vicioso se instala: pai não tem tempo para o filho, filho evita o pai quando este tem tempo.

A conclusão é que há algo errado na família."Porém ás vezes somos tão cegos que não percebemos o quando somos inteligentes emocionalmente fora de casa e burros dentro". (autor desconhecido).

Para um melhor entendimento, dividirei a predica em dois tópicos.
- Amor e utilidade.
- Depoimento de um filho.

Utilidade é um território muito perigoso, porque muitas vezes a gente acha que o outro gosta da gente mas não, ela está interessada naquilo que fazemos a ela. Por isso que a velhice é um momento que ultrapassa a utilidade e fica só seu significado como pessoa. É o momento em que a gente vai poder ver quem nos ama de verdade, porque só fica aquele que, depois da nossa utilidade descobriu nosso significado. Saber que já não sirvo para muita coisa, mas eu continuo tendo o meu valor.

Se quer saber se você ama o outro de verdade é só identificar se você seria capaz de tolerar sua inutilidade Pergunte a si mesmo: "Quem nesta vida já pode ficar inútil para você sem que você queira jogá-lo fora?" Só o amor nos dá condições de cuidar até o fim. Feliz é aquele que ao fim da vida tem a graça de ser olhado nos olhos e escutar: "Você não serve para nada, mas eu não sei viver sem você." (Pe.Fabio de Melo)  

E o que tudo isso nos diz respeito?

Muitos filhos só "amam" seus pais até o ponto que lhe são úteis. Em nossas vidas temos verdadeiros heróis, não de capa, corpos perfeitos e poderes sobrenaturais. Porém homens comuns que lutam e abrem mão de seu próprio conforto para dar aos próprios filhos o melhor.

Atentem ao depoimento deste filho:

"Meu pai, hoje, eu senti precisava te dizer muitas coisas.

A gente sempre se entendeu pelo olhar. Quando criança, eu sabia quando o senhor aprovava e já percebia o que vinha quando olhava virando os olhos para o lado e torcendo o canto da boca...eita!

Lembrei que quando éramos crianças e o senhor dava um tapa, depois ficava sentado na porta da cozinha chorando. Era o senhor que virava criança e nós íamos abraçá-lo... senão, o seu choro não parava. E o senhor nos pegava no colo e beijava e abraçava forte. Não era preciso dizer nada, lembra? E tudo
voltava ao normal.

Também lembrei das saias-justas em que te coliquei: eu era muito pequeno e mimado e o senhor me levou à casa do seu patrão, não sei por que, mas eu xinguei e o senhor correu tentando disfarçar: "- Não, ele não fala direito, está tentando falar outra coisa..."

Lembrei do dia em que o senhor apareceu em Belo Horizonte para me buscar, pois as aulas iriam começar e nada de a minha avó me levar para casa. Lembro do senhor no portão da casa da tia Esmeralda quando eu corri depois de a campainha tocar. Ninguém sabia, mas eu sabia que era o senhor quem estava lá. Pulei no seu colo, lembra?  Naquele momento, o tempo parou, meus medos desapareceram porque eu estava nos seus braços.

Lembrei dos passeios na sua lambreta, do primeiro carro, o fusquinha que o senhor comprou, dos domingos de pesca no Estoril. De pescar eu não gostava, como detestava quando o senhor me colocava no gol para aprender a jogar. Eu queria jogar como meu irmão, na linha, mas eu era "grosso", né? E não conseguia chamar sua atenção, então, emburrava, queria sair, porque via como o senhor babava pelo meu irmão. Ciúme bobo, meu velho!

Lembrei do dia das mães em que o senhor me chamou e aos meus irmãos e combinou de buscar o presente da mãe que estava no caminhão, lá fora. Esperamos ela dormir e fomos tirar da caixa e montar. De manhã, quando ela levantou, o fogão estava lá na cozinha, novinho, e ela sem acreditar abraçando todo mundo.

Lembro de tantas pequenas alegrias, coisas tão poucas e, por isso, mesmo tão grandes porque me mostraram o quanto fomos felizes.

Lembro do dia 13 de outubro de 1977: o senhor e o seu pai estavam radiantes. O Corinthians se tornava campeão depois de 23 anos. E isso aconteceu bem no dia do meu aniversário. Gritamos, choramos e nos abraçamos: três gerações, três vidas, três histórias que se entrelaçavam por um acontecimento banal, mas que queria dizer muito mais: eram pontos de vistas, crenças, certezas partilhadas.

Exemplos foram tantos: lembra do dia em que o senhor achou a carteira de uma pessoa, com dinheiro, e não descansou enquanto não achou o endereço para devolver? Eu era quase adolescente e já percebia a importância de fazer o que era certo.

E o dia em que o senhor apareceu com um moço que havia sido roubado na rodoviária e não tinha documento, nada... o senhor o trouxe para casa, acolheu, ajudou, e depois o colocou em um ônibus de volta a Minas Gerais, onde o rapaz vivia. "Já pensou uma situação dessa, num lugar desconhecido, perdido, sem dinheiro, sem endereço, sem nada... cê é besta..." o senhor falou e eu percebi como era bom ter alguém que se importava com os outros, mas eu sabia que era melhor ainda porque o senhor faria qualquer coisa por nós.

E faria mesmo: lembra daquele dia, na quadra de futebol de salão? O cara chutou meu irmão,o senhor estava fora da quadra e de repente já estava lá dentro socando o sujeito...e a confusão...o deixa disso, o senhor dizendo: -"se é louco? machuca meu filho para você ver se eu não te arrebento!" E, todo mundo ficou contra o sujeito. Se fosse outro, talvez tivesse virado briga geral, mas era o senhor, todos respeitavam porque conhecem seu caráter.

São tantas coisas que agora me lembro, mas teria de ficar horas descrevendo. Egoísta que sou, ficaria com todas as lembranças porque elas te manterão sempre comigo.

Só gostaria de lembrar de mais uma coisa entre tantos: do dia em que o senhor comemorou cinquenta anos de casado. Lembro do senhor de braço dado com minha mãe, na igreja, o sorriso mais franco e agradecido e isso me traz à memoria um comentário feito a 29 anos atrás.

Foi no dia em que vocês foram me visitar no seminário. Lembra? Meu orientador, um Frade franciscano, depois que vocês partiram me disse: "A maior herança que seus pais poderiam te deixar é a simplicidade deles.Tente se espelhar nisso!"

Hoje, pai, eu vi que tudo se resume a isso: a simplicidade com que o senhor passou por nossos vidas. Por isso, dói tanto, por isso eu ainda não acredito, por isso eu queria que o senhor soubesse que deixou um pouquinho do senhor em cada um de nós, seus filhos, seus netos, bisnetos.

O olhar de incredulidade de todos nós reflete a sua partida, também envolta em toda simplicidade, sem querer alarde, sem querer nos preocupar ou nos dar trabalho, querendo nos poupar do sofrimento.

Hoje, eu queria que o tempo voltasse e o senhor me chamasse com aquele tom de alegria, curto e gaiato: -"Preto!" e me desse o seu abraço inteiro, íntegro, amoroso e me faz esse sentir que está tudo bem. Sei que está. Vai ficar. Hoje, eu queria te disser, meu pai, algo que não me lembro de ter dito, mas que eu sempre quis e, por tantas amarras , não disse: -"Eu te amo!" (Aguinaldo Aparecido Campos).

Não escrevi este discurso pensando em respostas diretas ou significados de pai: O objetivo é perguntar sobre o real valor e significado para cada um de nós e poderemos olhar com os óculos do amor, aquele que mais doou-se por você.

Não vou falar para ligar para seus pais (ou quem representa sê-lo para vocês), é muito fácil desejar feliz dia dos pais e falar um rápido "eu te amo". Lanço um desafio maior: sabe seu pai? Seja, você mesmo essa inspiração de vida e lutas. Quer melhor modus procedendi que o próprio pai (o pequeno exemplo de ação para ser seguido).

Para melhor terminar a minha peça contarei uma história:

"Um jovem foi se candidatar a um alto cargo em uma grande empresa. Passou na entrevista inicial e estava indo ao encontro do diretor para a entrevista final. O diretor viu seu currículo, era excelente. E perguntou-lhe: "Você recebeu alguma bolsa na escola?" O jovem respondeu que não. "Foi seu pai que pagou pela sua educação?". "Sim", respondeu ele. "Onde é que seu pai trabalha?". "Meu pai faz trabalhos de serralheria".

O diretor pediu ao jovem para mostrar suas mãos. O jovem mostrou um par de mãos suaves e perfeitas. "Você já ajudou seu pai no seu trabalho?". "Nunca, meus pais sempre quiseram que eu estudasse e lesse mais livros. Além disso,ele pode fazer essas tarefas melhor do que eu." O Diretor lhe disse: "Eu tenho um pedido: quando você for para casa hoje, vá e lave as mãos de seu pai. E venha me ver amanhã de manhã."

O jovem sentiu que sue chance de conseguir o trabalho era alta! Quando voltou para casa,ele pediu a seu pai para deixá-lo lavar suas mãos. Seu pai se sentiu estranho, feliz, mas com uma mistura de sentimentos e mostrou as mãos para o filho. O rapaz lavou as mãos de seu pai lentamente. Foi a primeira vez que ele percebeu que as mãos de seu pai estavam enrugadas e tinham muitas cicatrizes. Algumas contusões
eram tão dolorosas que sua pele se arrepiou quando ele a tocou. Esta foi a primeira vez que o rapaz se deu conta do significado deste par de mãos trabalhando todos os dias para pagar seus estudos. As contusões nas mãos eram o preço que seu pai teve que pagar os dias para pagar seu educação, suas atividades escolares e seu futuro. Depois de limpar as mãos de seu pai, o jovem ficou em silêncio organizando e limpando a oficina do pai. Naquela noite, pai e filho conversaram por um longo tempo.

Na manhã seguinte, o jovem foi encontra-se com o Diretor. O diretor percebeu as lágrimas nos olhos do moço quando ele perguntou: "Você pode me dizer o que você fez e aprendeu ontem em sua casa? O rapaz respondeu: "Lavei as mãos de meu pai e também terminei de limpar e organizar sua oficina. Agora eu sei
o que é valorizar, reconhecer. Sem meus pais, eu não seria quem eu sou hoje... Por ajudar o
meu pai agora eu percebo o quão difícil e duro é para conseguir fazer algo sozinho. Aprendi a
apreciar a importância e o valor de ajudar a família".

O diretor disse: "Isso é o que eu procuro em meu pessoal. Quero contratar uma pessoa que possa apreciar a ajuda dos outros, uma pessoa que conhece os do sofrimentos dos outros para fazer as coisas, e que não coloca o dinheiro como o único objetivo na vida. Você está contratado."

Tenho dito e muito obrigado!
      
           
              

                          

 

 

























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